DECRETO Nº 19.632, DE 21 DE NOVEMBRO DE 2024
Declara estado de perigo público iminente de interrupção na prestação de serviços públicos pela organização social IBSAÚDE no hospital de São José do Norte
Publicado Em: Diário Oficial - Edição Nº 21/11/2024
Orgão/Secretaria: Administração
Categoria: Decretos
Autor: Bruno Mendonça Costa
Cargo: Secretário de Administração
DECRETO Nº 19.632, DE 21 DE NOVEMBRO DE 2024.
Declara estado de perigo público iminente de interrupção na prestação de serviços públicos pela organização social IBSAÚDE no hospital de São José do Norte e determina a intervenção municipal na modalidade de requisição administrativa de bens, empregados e serviços do referido estabelecimento hospitalar e dá outras providências.
A PREFEITA MUNICIPAL DE SÃO JOSÉ DO NORTE, Estado do Rio Grande do Sul, no uso das atribuições legais conferidas pela Lei Orgânica do município de São José do Norte, e
CONSIDERANDO que nos termos dos artigos 196 e 197 da Constituição Federal a saúde é direito de todos e dever do Estado, sendo de relevância pública as ações e serviços de saúde, ainda que prestados pela iniciativa privada, que a faz em caráter complementar;
CONSIDERANDO que as ações e serviços de saúde são de relevância pública, por isto ficam inteiramente sujeitos à regulamentação, fiscalização e controle do Poder Público, nos termos da lei, a quem cabe executá-los diretamente ou por terceiros, pessoas físicas ou jurídicas de direito privado;
CONSIDERANDO, que se a Constituição atribui ao Poder Público o controle das ações e serviços de saúde, significa que sobre tais ações e serviços tem ele integral poder de dominação, no sentido de controle total das ações da saúde pública;
CONSIDERANDO que é dever do Município preservar os direitos inalienáveis à saúde e a vida, e os interesses supremos da população à garantia e preservação desses direitos, nos termos da Constituição Federal;
CONSIDERANDO que segundo a doutrina do direito público e constitucional, qualquer iniciativa que contrarie esse direito inalienável à saúde e à vida, há de ser repelida veementemente;
CONSIDERANDO que as ações e serviços públicos de saúde e os serviços privados contratados ou conveniados que integram o Sistema Único de Saúde – SUS, são desenvolvidos de acordo com as diretrizes previstas no artigo 198 da Constituição Federal, regulamentado pela Lei Ordinária Federal nº 8.080/90 (Lei Orgânica da Saúde – LOS);
CONSIDERANDO que ao Município compete a organização, direção e gestão das ações e serviços de saúde executados pelo SUS em seu âmbito territorial e à direção municipal compete controlar e fiscalizar os procedimentos dos serviços públicos e privados de saúde;
CONSIDERANDO que a Lei Orgânica do município de São José do Norte dispõe no artigo 16 que compete, ainda ao Município, concorrentemente com a União ou o Estado, ou supletivamente a eles, zelar pela saúde, higiene, segurança e assistência públicas;
CONSIDERANDO que, nos termos do artigo 15, I, da Lei n.º 8.080/1990, os Municípios exercerão em seu âmbito administrativo a definição das instâncias e mecanismos de controle, avaliação e de fiscalização das ações e serviços de saúde e divulgação do nível de saúde da população e das condições ambientais, e:
CONSIDERANDO o artigo 5º, inciso XXV, CF/1988 e o artigo 15, inciso XIII, da Lei nº 8.080/1990 que para atendimento de necessidades coletivas, urgentes e transitórias, decorrentes de situações de perigo iminente, de calamidade pública ou de irrupção de epidemias, a autoridade competente da esfera administrativa correspondente poderá requisitar bens e serviços, tanto de pessoas naturais como de jurídicas, sendo lhes assegurada justa indenização;
CONSIDERANDO que o Instituto Brasileiro de Saúde, Ensino, Pesquisa e Extensão para o Desenvolvimento Humano - IBSAÚDE - é a atual gestora do único estabelecimento que garante assistência hospitalar no Município pelo SUS, mediante o Contrato de Gestão Compartilhada nº 33/2020;
CONSIDERANDO que foi solicitado, em 24/01/2023 (Memorando n 1.203/2023-MSJN) pelo Secretário Municipal de Saúde, a realização de encontro de contas de 2019, 2020, 2021 e 2022 do Contrato de Gestão Compartilhada nº 33/2020 pela Comissão de Fiscalização de Contratos da Saúde;
CONSIDERANDO o processo de tomadas de contas especial nº 029941-0200/23-0 perante o Tribunal de Contas do Estado do Rio Grande do Sul ainda sem julgamento de mérito, o qual versa sobre a comprovação de pagamentos feitos à IBSAÚDE durante os anos de 2019 a 2023;
CONSIDERANDO o teor da Portaria nº 003, de 31 de janeiro de 2024, a qual determinou-se a abertura de descumprimento contratual em face do IBSAÚDE para apuração de irregularidades e a imposição de sanções ao contratado, com fundamento no contrato de gestão compartilhada (Procedimento Administrativo nº 071/2024);
CONSIDERANDO o “Relatório Situacional” elaborado pelo Secretário Municipal de Saúde sobre a administração do Hospital Municipal pelo IBSAÚDE juntado ao Memorando nº 19.653/2024-MSJN;
CONSIDERANDO que a partir de abril de 2024, o IBSAÚDE mudou a sistemática de faturamento dos valores contratuais do Hospital Municipal, unilateralmente, sem qualquer justificativa plausível;
CONSIDERANDO que ao arrepio da previsão contratual, a modificação da sistemática de gerenciamento dos custos do Hospital e da organização dos documentos da prestação de contas, deixaram de ser feitos no próprio Hospital (à exceção do custo indireto, o qual não era feito no HMSJN) para serem executadas na sede do IB SAÚDE;
CONSIDERANDO que durante os eventos de enchentes que assolaram o Rio Grande do Sul o Governo Federal autorizou o pagamento de FGTS em momento posterior ao regular. Todavia, o IBSAÚDE recebeu os valores referentes ao FGTS dos funcionários do Hospital, não tendo efetivado seu pagamento. Questionado, o Instituto respondeu à Comissão de Fiscalização sobre a autorização para pagamento em prazo dilatado. Porém, o valor havia sido pago ao IBSAÚDE e deveria ter sido imediatamente quitado; houve glosa relativa a falta de apresentação dos comprovantes de pagamento;
CONSIDERANDO que em meados de agosto/2024, começaram a ocorrer relatos de insuficiência financeira para custeio das atividades do Hospital. Todavia, o IBSAÚDE não manifestou, em momento algum, que tal situação seria derivada de um determinado mês. A situação foi agravando-se, sem que o IBSAÚDE manifestasse detalhadamente quais eram os empecilhos à quitação das dívidas da execução do serviço do Hospital. Mantinham apenas a conduta reiterada de cobrar o pagamento do teto contratual, sem glosas de qualquer natureza;
CONSIDERANDO que o ápice de gravidade da situação foi quando o IBSAÚDE comunicou o acúmulo de mais de dois meses de falta de pagamento a credores. A fim de resolver o problema, a Secretaria Municipal de Saúde oficiou o Instituto para que, no prazo de 24h, encaminhasse listagem com nome dos fornecedores com dívida em aberto, valor da dívida, números das notas fiscais endereço da sede e contato telefônico, conforme Ofício nº 3.372/2024. Em resposta, o IBSAÚDE protocolou ofício reiterando a situação de gravidade, informando valor de dívida, mas sem atender especificamente o solicitado;
CONSIDERANDO que o desalinhamento das condutas do IBSAÚDE prosseguem, de modo que recorrentemente a Secretaria Municipal de Saúde tem conhecimento de novas dívidas com fornecedores do Hospital. Ademais, a Comissão de Fiscalização dos Contratos de Saúde vem reiteradamente indicando glosas e desorganização nas prestações de contas, reforçando o entendimento da SMS acerca do fato de que a centralização financeira do Contrato na sede do IBSAÚDE em Porto Alegre, além de estar na contramão do contrato, contribui diretamente para o desequilíbrio econômico financeiro contratual;
CONSIDERANDO que durante a ocorrência de tais situações, a Direção local do Hospital Municipal tem recorrido a todos os meios possíveis para não paralisar os serviços, fato que vem sendo percebido pela SMS. Foram solicitados diversos empréstimos de materiais e medicamentos entre o Hospital Municipal e outros dispositivos da região, dado o atraso nas compras, derivado de bloqueio de fornecimento por prestadores, oriundo do atraso nos pagamentos;
CONSIDERANDO que à Comissão de Fiscalização dos Contratos de Saúde no Memorando nº 18982/2024, relatou sobre os custos indiretos, baseado nos encontros de contas que muito embora o Ib Saúde alegue que exista irregularidade na retenção no pagamento, até o presente momento não vem prestando contas de forma adequada, bem como não apresenta cálculo de rateio do ano de 2024. Reiterando que apresentar um link do google drive com notas, sem qualquer planilha com o resumo de valores, ou sua finalidade não configura prestação de contas;
CONSIDERANDO que a Comissão de Fiscalização dos Contrato de Saúde vem reiteradamente solicitando que seja encaminhado prestação de contas do custo indireto detalhado, bem como cálculo de rateio com base nos contratos firmados, para que assim possa ser definido um valor proporcional a ser pago;
CONSIDERANDO a desorganização financeira para o custeio do Hospital, acumulando dívidas com recursos aplicados em conta bancária;
CONSIDERANDO que o impacto da desorganização financeira na manutenção da prestação dos serviços, com risco de falta de maiores fornecimentos de insumos e até interrupção de prestação de serviços, dado o cenário;
CONSIDERANDO o risco de acúmulo de passivos trabalhistas por falta de recursos para o devido provimento, com ausência de explicação sobre o destino dos recursos repassados a título de provisões em importância alta de recursos;
CONSIDERANDO que a má administração do IBSAÚDE preocupa a rede SUS, pois o fechamento da entidade representa um prejuízo imensurável, não apenas nos atendimentos e leitos que deixarem de ser fornecidos, mas também, nos recursos públicos já imobilizados no Hospital Municipal;
CONSIDERANDO que o IBSAÚDE protocolou Ofício informando a rescisão contratual no prazo de 30 dias, o qual se encerra em 14/12/2024, fazendo alegações, sem qualquer comprovação, de que a Prefeita teria aceito os termos propostos e se comprometido com a quitação das verbas trabalhistas, Protocolo nº 11655/2024. A Prefeita encaminhou resposta ao IB Saúde, Ofício nº 3.878/2024, negando a forma como o Instituto se posicionou sobre a reunião;
CONSIDERANDO que a atual conjuntura impõe ao governo municipal a adoção de medidas urgentes e especiais;
CONSIDERANDO que o instituto de direito público da intervenção é o meio adequado para que o Poder Executivo Municipal intervenha nas situações de perigo iminentes e efetivas que comprometam a promoção, a proteção e a recuperação da saúde pública, neste caso, para garantir a manutenção do adequado funcionamento das instalações do Hospital Municipal;
CONSIDERANDO que todos os documentos acima citados constituem-se numa prova material de que o IBSAÚDE age de forma negligente e ignora que as falhas persistentes e corriqueiras gerenciais e financeiras perpassa pela complexa atividade de garantir atendimento de saúde pública de forma condizente com os princípios da dignidade da pessoa humana;
CONSIDERANDO a obrigatoriedade dos gestores públicos zelarem pela predominância dos princípios constitucionais da legalidade, impessoalidade, publicidade e sobretudo da moralidade e eficiência, eficácia e efetividade, além da necessidade de zelar pela escorreita aplicação dos recursos públicos;
CONSIDERANDO que a Constituição Federal adotou como um dos fundamentos da República a dignidade da pessoa e que, aplicado às ações e aos serviços de saúde, o conceito implica o poder de controle pela sociedade e pelo Estado, visando zelar pela sua efetiva prestação e por sua qualidade;
DECRETA:
Art. 1º Fica determinado por meio do presente decreto a requisição dos bens, empregados e serviços, com intervenção do Poder Executivo no IBSAÚDE, organização social, e de utilidade pública, inscrita no CNPJ sob n° 07.836.454.0004-99, situado na Rua Edgardo Pereira Velho, nº 286, São José do Norte/RS - Hospital Municipal. Ficam requisitados também o uso das contas 0041 – COLISEU, CONTA: 06.206347.9-6, NOME: IBSAUDE PROJETO SAO JOSE DO NORTE custeio AGÊNCIA: 0041 – COLISEU, CONTA: 06.206347.8-8, NOME: IB SAUDE FUNDO DE RESERVA S J NORTE provisão, vinculadas ao CNPJ da Matriz, sob o número 07.836.454/0001-46.
Parágrafo único. A intervenção vigorará pelo prazo de 180 (cento e oitenta) dias, contados da publicação do presente decreto, podendo ser prorrogada por igual período, devidamente motivada.
Art. 2º As causas determinantes da intervenção, que isoladamente ou em conjunto implicam iminente risco quanto à regularidade da gestão empreendida pelo IBSAÚDE no Hospital Municipal de São José do Norte são as constantes deste decreto.
Art. 3º A intervenção terá como metas principais:
I - a elaboração e apresentação de um diagnóstico da situação operacional, financeira-econômica e gestão da entidade;
II - a manutenção de todos os serviços hospitalares, especialmente os de atendimentos de urgência, emergência e de plantões de 24 (vinte e quatro) horas.
Art. 4º Para o desempenho das atribuições decorrentes da presente intervenção fica constituída como Interventora a Sra. Suelen da Rosa Costa, brasileira, solteira, farmacêutica, diretora administrativa do Hospital Municipal, inscrita no CPF nº 008.657.300-40.
Parágrafo único. Para o desempenho de suas atribuições a Interventora poderá utilizar quaisquer bens do IBSAÚDE de São José do Norte, bem como toda a estrutura física do hospital.
Art. 5º Periodicamente, a Interventora apresentará relatório ao Poder Executivo Municipal relativo às suas atividades, bem como da situação apurada na instituição.
Art. 6º Para o desempenho de suas atribuições, a Interventora poderá praticar todo e quaisquer atos inerentes à presente intervenção, entre os quais:
I - requisitar serviços e servidores de repartições públicas municipais e solicitá-los a repartições de outras esferas de governo, indispensáveis ao cumprimento de suas atribuições;
II - gerir os recursos destinados ao IBSAÚDE, podendo, para isso, movimentar contas bancárias e, se necessário, abrir novas contas;
III - movimentar, admitir e demitir empregados, bem como gerenciar toda administração pessoal necessária ao bom andamento dos serviços do hospital, além de rescindir contratos;
IV - providenciar inventário dos bens e equipamentos, além de medidas de ordem técnica, administrativa, jurídica e financeira necessárias ao restabelecimento do pleno e adequado funcionamento da entidade, se necessário for, inclusive mediante a instauração de auditorias específicas;
V - renegociar dívidas da instituição junto a fornecedores, prestadores de serviços ou instituições financeiras.
Parágrafo único. Além das prerrogativas previstas no presente Decreto, a Interventora deterá todas as atribuições de direção da instituição, nos termos estatutários e\ou regimentais.
Art. 7º A remuneração da Interventora será igual ao valor do último salário pago para a Diretora Administrativa do IBSAÚDE.
Art. 8º Em decorrência do presente Decreto, à exceção da Interventora e das Chefias da área médica e da enfermagem, ficam todos os demais integrantes da atual diretoria afastados das atividades de direção da instituição e os profissionais ou empresas contratadas para esse fim.
Art. 9º A presente intervenção não transfere ao Município responsabilidades trabalhistas, previdenciárias ou outras advindas de vínculos empregatícios em vigor ou outros que poderão advir durante a intervenção.
Art. 10. Em razão do disposto no artigo 8º, no momento da intervenção, poderão os servidores municipais requisitar apoio da Polícia Militar, da Guarda Municipal, bem como providenciar a troca das chaves das salas administrativas, bem como impedir o acesso dos integrantes da atual diretoria as dependências do Hospital de São José do Norte.
Art. 11. Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação.
São José do Norte/RS, Cidade Histórica, 21 de novembro de 2024.
FABIANY ZOGBI ROIG
Prefeita
Registre-se, Publique-se e Cumpra-se.
BRUNO MENDONÇA COSTA
Secretário Municipal de Administração